quinta-feira, 30 de abril de 2015 92 comentários

A Umbanda e As Oferendas. As Oferendas e a Umbanda.

       



    Aos filhos que estão acostumados em participarem de Giras (sessões
Umbandistas), já muito ouviram falar de "oferendas".

    Mas o que se consiste a oferenda ?

    A quem devemos ofertar algo ?

    O que devemos oferecer ?


    Muitos Pais e Mães de Santo ao lerem esse texto vão de início
discordar terminantemente com a visão composta nele, mas de antemão
gostaria de frisar que esse texto foi conduzido pelo mentor de nossa
casa, sendo assim para nós a regra a ser seguida, pois a visão
colocada sobre oferendas é algo muito mais simples do que os pregados
por algumas pessoas, que infelizmente se utilizam desse ritual para
elaborar com prepotência o ego vaidoso dos que se dizem responsáveis
por um Terreiro de Umbanda.

    As oferendas podem ser cedidas por qualquer um de nós, podem ser
ofertadas o que é desejado por nós, podem ser entregues em qualquer
lugar que desejarmos. Isso está dentro de nosso livre arbítrio, querer
ou não entregar uma oferenda.

    Mas as perguntas são:

    Um Orixá ou uma Entidade de Luz nos cobra isso?

    Eles necessitam desses artifícios em sua jornada espiritual?

    Será que seremos cobrados de alguma maneira caso não for entregues
essas oferendas?

    Em resposta a todas essas perguntas vamos colocar da seguinte
maneira:

    Um Orixá é uma força predominante da natureza. Eles estão
presentes nos dias e noites, nos verões e invernos, no dia quente ou
na tarde chuvosa, eles vem com a pequena brisa ou com as fortes
tempestades. Se encontram nos rios e mares, na terra ou na Lua, nas
montanhas ou nas matas. Ou seja, os Orixás estão presentes em tudo.

    E estão com essa presença constante pois os Orixás são anjos de
Zambi (Deus), e Deus se encontra em tudo e em todos.

    Se essa é a colocação de um Orixá, se eles são a força geradora de
tudo, e comandados por Deus, refletiremos então, pra que uma força
assim iria cobrar oferendas para nos proteger?

    Não iriam, e não cobram.

    Então sobre Orixás já ficou um tanto explicado que não há
necessidade de ser imposto oferendas, nem para eles nos proteger, nem
pra eles vibrarem em nossa coroa, mesmo que esses Orixás sejam Pais,
Mães ou Terceiro Santo de nosso Ori.

    Agora vamos a nossas amadas Entidades de Luz.

    O que chamamos aqui de Entidades de Luz são nossos Pretos e Pretas
Velhas, Caboclos e Caboclas, Ibeijadas, Boiadeiros, Malandros e
Malandras, (Baianos), Ciganos e Ciganas, Pombo Giras e nossos
guardiões Exús.

    Nossas queridas Entidades de Luz estão no caminho de evolução
grandiosa, por isso que são Entidades de Luz. Sendo visto dessa forma,
um ser que tem uma luz tão brilhante, que nos ensina a sermos
humildes, que nos da lições a cada dia de Gira no Terreiro, que prega
sempre buscar fazer a caridade, que nos incentiva a fazer o bem sem
olhar a quem, será que esse ser divino vai nos cobrar oferendas?

    Não, não vai. Nenhuma Entidade de Luz vai lhe cobrar oferendas,
nenhuma delas vai lhe abandonar se você não lhe der algo, nenhuma
delas vai deixar você doente ou na miséria se você não oferecer trocas
por alguma ajuda pedida.

    Estamos falando de seres com a força da natureza e seres
evoluídos, estamos lidando com algo muito acima do que a ganância dos
seres humanos, estamos buscando caridades de seres divinos que sabem
ser caridosos sem cobranças.

    Então não há necessidade de dar algo para receber alguma coisa.

    É claro que poderemos oferecer algo sim. Em primeiro lugar
oferecer nossa fé, nosso amor, nosso carinho e nosso respeito aos
Orixás e as Entidades de Luz.

    Mas caso desejar oferecer algo visível, palpável, algo que seja de
sua vontade e não imposto, pode ser coisas simples, coisas não
mirabolante como é visto em algumas casas.

    Abaixo colocarei exemplos de coisas assim.

    Para Orixás:

Velas nas cores dos Orixás sempre são muito bem aceitas. Pode ser
acesas em Gongás, altares, ou simplesmente dentro de casa, com seu
respeito, demonstrando a sua intenção, pedido ou agradecimento.

    Para quem desejar fazer uma oferenda que seja além das velas vou
descrever abaixo o que poderia ser a cada Orixá. Lembrando sempre que
é um agrado pessoal, pois o Orixá não cobra nada.

OXALÁ: Além de velas brancas, podem ser ofertadas frutas brancas, como
goiaba, melão, etc. Também podem ser oferecidas fitas brancas, flores
brancas, além de comidas como canjica e arroz doce, além de milho
verde em espiga. Sendo essas comidas feitas ofertadas em Terreiros, e
após o ritual, os filhos da casa podem se alimentar dessas iguarias.

OXOSSI: Além das velas verdes ou brancas também pode ser ofertadas
fitas na mesma cor, frutas de todas as espécies ou comidas sendo
morangas cozidas, milho verde cozido, maçã cozida regada ao mel,
sendo comidas oferendas de Terreiro e distribuídas aos filhos da casa
após o ritual.

XANGÔ: Velas e fitas marrons, frutas como abacaxi, melão, figo, manga,
melancia, goiaba vermelha, caqui ou laranja. Comida quiabo cozido,
rabada com rodelas de cebola. Sempre sendo distribuídas aos filhos da
casa no findar do ritual.

OGUM: Velas e fitas vermelhas, flores vermelhas como cravo e palmas
vermelhas. Frutas como melancias, laranja, pera, goiaba vermelha,
ameixa preta,abacaxi ou uvas. A comida pode ser a feijoada, que no
final do ritual deverá ser distribuído aos filhos da casa.

OBALUAIÊ: As velas ou fitas podem ser nas cores brancas ou traçadas
brancas e pretas, as flores podem ser crisântemos brancos e
quaresmeira, as frutas oferecidas podem ser pinha, caqui, coco seco e
as comidas são pipoca estourada no azeite de dendê, batata doce roxa
cozida ou beterraba cozida regada no mel de abelha, mandioca cozida
cortada em formas cilíndricas e açucaradas.

OXUM: Velas e fitas nas cores azul anil, podendo também ser na cor
azul claro. As flores podem ser rosas vermelhas, amarelas ou brancas.
Frutas podem ser cereja, maçã, pera, framboesa, melancia, goiaba,
figo, pêssego, etc. As comidas podem ser quindim, muqueca de peixe,
banana frita, pirão feito com a cabeça do peixe. Sempre sendo
distribuídas aos filhos da casa após o ritual.

OMULÚ: Velas ou fitas nas cores amarelas e pretas traçadas, flores
crisântemos, rosas brancas e flores do campo. As frutas que podem ser
oferecidas são, maracujá, ameixa preta, ingá, figo e as comidas que ao
final de cada ritual devem ser oferecidas aos filhos da casa são,
pipocas estouradas regadas ao mel, coco seco fatiados, e também
regados com mel, batata doce roxa
regadas com mel, coco seco fatiado e regado com mel,  batata doce roxa
cozida regada com mel.

IANSÃ: Velas e fitas na cor amarelo, qualquer flor amarela, frutas
podem ser, laranja, abacaxi, pitanga, uva, morango, ambrósia,
melancia, melão amarelo, pêssego e goiaba vermelha e as comidas como
acarajé, abacaxi em calda e arroz doce com bastante canela em pó por
cima e após ritual distribuir aos filhos do terreiro.

NANÃ BURUQUÊ: Velas e fitas na cor lilás, flores como crisântemos,
flor do campo e lírios. Frutas tipo uva, melão, manga, mamão, maracujá
doce, framboesa, amora, figo.

IEMANJÁ: Velas e fitas nas cores brancas ou azul claro, flores, rosas
brancas, palmas brancas, lírio branco, as frutas melão em fatias,
cerejas, laranja lima, goiaba branca, framboesa e as comidas manjares;
peixes assados; arroz doce com bastante canela em pó e da mesma forma
oferecidas aos filhos da casa.



    Agora para as Entidades de Luz:

PRETOS VELHOS: Velas e fitas nas cores brancas ou traçadas preta e
brancas, as frutas podem ser de todas as espécies, podem ser
oferecidas bebidas como café, vinho doce, cerveja preta, água de coco,
vinho branco licoroso, as flores crisântemos brancos, margaridas,
lírios brancos, e podem ser oferecidas as comidas arroz doce, canjica,
bolo de fubá de milho, milho cozido, doce de coco, doce de abóbora,
doce de cidra, coco fatiado, quindim, que além dos filhos da casa
saborearem, também a Entidade que estará incorporada ao seu médium
poderá saborear.

CABOCLOS: Normalmente as oferendas a Caboclos e Caboclas são iguais a
dos Orixás que os regem, ou seja, no geral são iguais as dos Orixás e
no particular são acrescentados elementos indicado por cada Caboclo ou
Cabocla.

IBEIJADA (ERÊ): Velas e fitas brancas, azuis, rosas ou traçadas rosas
e azuis,, todas as flores podem ser oferecidas as crianças, e as
frutas podem ser uva, pêssego, pera, goiaba, maçã, morango, cerejas,
ameixa. As comidas podem ser doces de frutas, arroz doce, cocadas,
balas, bolos açucarados, quindins e acompanhados com refrigerantes,,
água de coco e suco de frutas.

BAIANOS: Velas e fitas brancas e amarelas, frutas coco, caqui,
abacaxi, uva, pera, laranja, manga, mamão. Bebidas, batida de coco, de
amendoim, pinga misturada com água de coco. As flores, flor do campo,
cravo, palmas e as comidas acarajé, bolo de milho, farofa, carne seca
cozida e com cebola fatiada, quindim.

BOIADEIROS:
velas brancas, vermelhas, amarelas, azuis escuras e marrom. Devem ser
oferecidas todas as frutas e as bebidas podem ser vinho seco,
aguardente, batidas, conhaque, licores. Flores como palmas, flor do
campo, cravos. E as comidas feijoada, charque bem cozido e bolos

MALANDROS E MALANDRAS: Velas e fitas nas cores brancas, vermelhas ou traçadas
vermelhas e brancas. As flores podem ser cravos brancos para os
Malandros e rosas brancas para as Malandras. Frutas coco, caqui,
abacaxi, uva, pera, laranja, manga, mamão. Bebidas, batida de coco, de
amendoim, pinga misturada com água de coco.

POMBO GIRA: Velas e fitas vermelhas ou traçadas vermelhas e pretas, as
flores podem ser oferecidas as rosas vermelhas, as frutas podem ser
maçãs, morangos, uvas rosadas, caqui, e as bebidas champagne de maçã,
de uva, de sidra, licores de todos os sabores.

EXÚ: Velas e fitas pretas ou traçadas vermelhas e pretas, flores
deverá ser o cravo vermelho, e as frutas como manga, mamão e limão.
Bebidas aguardente de cana de açúcar, whisky e conhaque, as comidas
como farofa com carne bovina ou com miúdos de frango, bifes de carne
ou de fígado bovino fritos em azeite de dendê e com cebolas, bifes de
carne ou de fígado bovino temperado com azeite de dendê e pimenta
ardida. Essa oferenda de comidas é para ser distribuída aos filhos
do terreiro, pelos Exús que estarão incorporados em Médiuns
preparados mediunicamente para esse tipo de incorporação. Não devendo
ser permitido médiuns não desenvolvidos, mistificadores ou vaidosos
nesse trabalho e nesse aceite de oferendas.


    Como foi visto acima, tem diversos modos de fazer uma oferenda a
um Orixá ou as Entidades de Luz. E como foi frisado bem nas colocações
acima, as oferendas são formas de um consulente ou um Médium
agradecer, homenagear ou agradar o Orixá ou a Entidade de Luz que
desejar, mas nunca é imposto isso, nunca deverá desperdiçar alimentos,
não tem necessidade de entregas em encruzilhadas, cemitérios, ou em
qualquer lugar que não seja de acordo com seu livre arbítrio. Se uma
pessoa desejar fazer essa oferenda, faça de modo consciente, limpo, de
coração aberto e sem pedidos de amarrações, maledicências, atrapalhar
a caminhada de um semelhante ou fazer mal a alguém, pois fazendo desse
modo poderá estar alimentando Espíritos sem Luz, Kiumbas e Zombeteiros
com a oferenda que se acredita estar entregando a um Orixá ou uma
Entidade de Luz.

    Desconfie sempre desses Pais e Mães de Santo que pregam oferendas
grandiosas, em lugares que a pessoa pode ficar desconfortável para
"entregar", com cobranças em dinheiro para que seja passado a "lista"
de materiais a serem entregues, com intimidações para amedrontar,
dizendo que cobranças por partes dos Orixás ou Entidades de Luz,
cairão, caso não seja feita a oferenda, sobre a pessoa em questão.

    Nada disso é real. Isso é apenas um modo de coagir aos filhos de
fé a entrarem em uma constante forma de oferendas, que para serem
entregues, deverão pagar quantias em dinheiro ao relator do tal
pedido.

    Como foi frisado acima, pode-se sim fazer a oferenda que desejar
sem a obrigação como e pregado por muitas pessoas. Faça o que desejar,
a hora que desejar e no lugar que desejar, sempre respeitando a nossa
Mãe Natureza.

    Assim certamente nossos amados Orixás e Entidades de Luz vão estar
sempre presente conosco, assim como nossa fé vai estar elevada a eles.

    Reflita: Sua Oração, sua pequena vela entregue com carinho e sua
fé valem muito mais que grandiosas oferendas impostas.

    Os Orixás e Entidades de Luz necessitam de sua fé e de sua
felicidade apenas para se iluminarem cada vez mais. Afinal, eles são
divindades de Deus e não objeto de troca do homem.

    Salve nossos Orixás e nossas Entidades de Luz!

Carlos de Ogum



segunda-feira, 20 de abril de 2015 71 comentários

A História de Vovô Joaquim

               


Vô Joaquim lerê,
Vô Joaquim Lerá,
Vô Joaquim já vem de Angola,
Vô Joaquim vem de Angola, Angolá...


    Vô Joaquim é um Preto Velho caridoso, extremamente bondoso e
humilde, com sua fala mansa e cheia de ternura, que trabalha em prol
da caridade nos Terreiros de Umbanda trazendo sua paz, curando
enfermos, trazendo luz nos caminhos escuros, ensinando a humildade a
seus filhos e demonstrando o valor da fé.

    Dentro da Umbanda Vô Joaquim tem uma importância especial, pois é
ele que comanda todos os outros Pretos Velhos que trabalham na linha
do Orixá Oxossi. E mesmo tendo outras variantes de nomenclaturas de
Vô Joaquim, como Joaquim D'angola, Do Congo, Das Almas, entre outras,
todos Médiuns que tem em sua coroa um Vovô ou Pai Joaquim, tem uma
ligação forte do Orixá Oxossi, sendo Pai ou protetor de coroa desse
Médium.

    Vovô Joaquim tem uma grande experiência com ervas, e delas faz
seus trabalhos de benzeduras, limpezas, descarregos, desobsessão,
curas tanto do corpo físico como do espírito.

    Ele tem um modo de trabalho espiritual extremamente diferenciado
de muitos Pretos Velhos, pois as suas ações são determinadas pelo seu
próprio tempo, sendo ele bastante sereno, muitas vezes antes de falar
algo ou fazer uma limpeza que seja necessária a um consulente, ele
calmamente cachimba, olha a fumaça que se esvai no ar, olha em sua
volta, cachimba novamente, sorri, da um longo e vagaroso gole no seu
café sem açúcar ou no seu vinho moscatel, para serenamente olhando as
palmas das mãos, faz as suas orações como se cochichasse com Zambi ou
os Orixás, e sorrindo fala ou faz o que deve ser falado ou feito sem a
menor pressa e sempre dentro de seu tempo e serenidade.

    É dito que Vô Joaquim é um dos mais velhos, em relação a idade
cronológica, Pretos Velhos que trabalham para a caridade nos Terreiros
de Umbanda. Muitos acreditam que ele em sua vida terrena perdeu a
conta de anos que passou encarnado, de tantos que foram. E ainda é
dito que ele ultrapassou com folga a idade terrena da Preta Velha
Vovó Joaquina, que era conhecida como Velha Feiticeira ou simplesmente
Chica. Que pelas histórias contadas nos Terreiros de Umbanda, ela
ultrapassou a idade terrena de Pai Benedito da Calunga, que afirma ter
desencarnado com 120 anos. Se nosso querido e risonho Pai Benedito
desencarnou com 120 anos de idade, e se a Vovó Feiticeira ultrapassou
essa idade, imaginemos então a que idade terrena chegou nosso amado Vô
Joaquim, que dizem ser um dos mais idosos Pretos Velhos da Umbanda.

    Vovô Joaquim foi um negro escravizado lá pelo século XV para o
século XVI. Pelas histórias contadas, era ele um negro forte,
inteligente, que compreendia o que dizia os sons dos ventos, dos rios
e das matas. E assim ele buscava respostas as suas dúvidas e falta de
compreensão em algumas coisas que para ele não devia existir na terra
oferecida pelo Pai Maior, Zambi, no qual ele se entregava em orações
elevando sempre sua fé.

    Joaquim, ainda moço, era visto por muitos da fazenda, na qual ele
era escravizado, como o abençoado das matas e da Lua. Pois ele buscava
sua serenidade no brilho da Lua, a Lua que ele chamava de "Penumbra de
Zambi", assim como buscava entendimento nas matas para que assim fosse
possível, através de ervas, raízes, frutos e sementes, fazer seus
medicamentos, compressas, limpezas de corpo e espírito, macerando
tudo que necessitava para que o resultado sempre fosse perfeito, assim
como ele aprendeu com os negros mais velhos e que com perfeição faziam
esse trabalho de caridade, tanto aos brancos, quanto aos negros da
época.

    Com o passar do tempo, Joaquim ficou bem conhecido por toda a
região, sendo ele respeitado por brancos e negros, homens e mulheres,
crianças e idosos, coronéis e escravos.

    Já com um grande conhecimento adquirido, juntamente com sua luz
própria e a força da natureza, principalmente das matas, da Lua e dos
rios com suas águas límpidas, Vô Joaquim, por ordem dos Senhores de
Escravos da região e de seu próprio senhor, um coronel cafeicultor
muito exigente e bastante cruel, ordenou a ele que seguisse de fazenda
em fazenda da região buscando curar os negros adoentados. E se caso o
mal físico apresentado pelo negro não fosse possível ser tratado em
tempo curto, ele, o próprio Joaquim, estaria responsável por terminar
com o dito "problema", ceifando a vida do negro enfermo, e se não
fizesse iria ao tronco para ser açoitado até a morte.

    Vô Joaquim ficou desesperado com a ordem dada pelo seu coronel.
Ele nunca poderia tirar a vida de um semelhante. Não sabia o que
fazer, clamava a "Senhora Lua" uma resposta, pedia a "Floresta Mãe" um
caminho. Rezou, orou e chorou, e após momentos de intensos pensamentos
desalinhados em sua mente, decidiu que não acataria as ordens dadas
pelo famigerado coronel, e dos seus cúmplices no extermínio aos seus
irmãos negros adoentados.

    Já disposto a falar com o coronel a sua decisão, e já preparado
para receber a pena que sofreria, entendendo que assim entregaria sua
vida mas não limitaria a vida de um só ser, Joaquim observando o céu
já anunciando a chegada das brilhantes estrelas que enfeitariam mais
uma noite linda, olha firmemente para a sua companheira brilhante, a
tão sublime Lua de Ogum e deixa suas lágrimas rolarem na face já
cansada.

    Por um instante escuta o som de um assobio intenso e agudo, no
qual lhe chama bastante atenção. Seguindo o som, Vô Joaquim se
entranha na mata. Os assobios se tornam mais intensos e cada vez mais
próximos. E sem ele menos esperar sai de trás de um tronco de árvore
um ser de aparência indígena, demonstrando serenidade, e seriedade
intensa.

    Vô Joaquim fica um pouco apreensivo, pois nunca tinha visto alguém
com essas características pela região. Mas mesmo assim fintou
firmemente os olhos do índio, que após abrir um ar de sorriso e logo
tornando seu rosto mais sério que antes disse:

    "Negro filho das matas e protegido pela Lua de meu irmão Ogum. Sua
decisão de entregar-se ao destino sombrio das mãos pecaminosas da
morte, é algo impensado e errôneo. Você Negro, filho das terras
africanas, terras essas que fazem dos homens símbolos da coragem e da
fé, não deve procurar apenas os caminhos impostos pelos seus senhores
brancos. A resposta desse seu impasse virá de uma caridade que deverá
prestar e da coragem que deverá demonstrar. Quando chegar o momento, tu Negro bondoso e caridoso, vai saber o que fazer. Agora retorne de onde viestes e se feche em oração a Oxalá e a Zambi, nosso Pai Maior."

    E assim o índio desaparece adentrando nas matas, apenas iluminado
pelos raios do luar que passavam pelas densas folhas das grandiosas
árvores, sem que ao menos Vô Joaquim percebesse o caminho tomado por
ele.

    O velho Joaquim, retornando até a margem do rio em que passava
horas em oração, sentou-se ao chão, levantou seu olhar para a deusa
Lua, abriu os braços como que se quisesse abraçar toda aquela força e
brilho emanada pela "penumbra de Zambi", e se voltou em orações, sem
mais pensar na decisão que tinha tomado horas antes.

    No dia seguinte, o Sol já raiava, e Vô Joaquim ainda se encontrava
sentado a beira do rio, quando ouve o trote acelerado de um cavalo que
trazia o feitor que aos gritos chamava pelo seu nome.
Após uma breve conversa, Joaquim entende que o coronel cafeicultor o
mandara buscar com urgência, pois a pequena sinhazinha, filha do
coronel, se encontrava adoentada, acamada, sem forças e todos temiam
pelo pior.

    O Velho Joaquim sobe a garupa do cavalo do feitor, e partem para a
casa grande, onde se encontrava a menina enferma.

    Ao chegar aos aposentos da menina, Joaquim se depara com um
coronel desesperado, choroso e clamando pela vida de sua amada filha
única. E essa se encontrava deitada, pálida e inerte.

    O coronel chega ao negro e lamenta intensamente, pede em tom baixo
que ele salve a sua filha.

    Vô Joaquim, com seu ar sereno, pede calma ao coronel. Ele se
ajoelha ao lado da menina, fecha os olhos e faz suas orações. Nesse
momento vem a sua mente a imagem do índio que lhe apareceu nas matas,
que lhe diz: "Chegou o momento de mostrar caridade e coragem."

    Nesse instante, num salto ímpeto, Joaquim se levanta olhando
fixamente aos olhos do coronel, lhe dizendo:

    "Meu senhor, infelizmente os males de sua pequena sinhazinha são
extremos. Poderá ela lutar pela vida, mas isso demorará intensamente.
Sendo assim, só tenho uma coisa a fazer, que será ceifar
antecipadamente com a vida de sua menina, assim como me ordenou a
fazer com a vida dos negros enfermos. E talvez como as mães e pais
desses negros que terei que antecipar a morte, o senhor coronel deverá
se conformar, pois estarei tão somente acatando suas ordens. Ordens
essa de ser o mensageiro da fria e sombria morte."

    O coronel ao ouvir isso se pôs de joelhos aos pés do velho negro,
clamando por ajuda, pedindo perdão e dizendo que agora ele entendeu a
dor de perder um ente querido, mesmo tendo a possibilidade de
salvá-lo. E que Joaquim poderia peregrinar por entre as senzalas,
rezando e fazendo suas benzeduras para salvar a todos os negros,
independente do mal e do tempo que isso levasse.

    Vovô Joaquim novamente se voltou a sinhazinha, se pôs em oração,
fez algumas compressas com ervas e raízes que ele tinha consigo, e
colocou no pequeno corpo da menina. Fechou os olhos e fez sua
benzedura. Ao abrir os olhos viu a imagem do índio aos pés da cama da
pequena enferma, que lhe deu um pequeno ar de sorriso. O índio abre os
braços em frente a menina, e Joaquim ouve o assobio tão característico
e conhecido para ele. O índio desaparece, e o negro com um sorriso
sereno, da continuidade a suas orações, e poucas horas depois a
pequena menina, já com um sorriso no rosto e um tom mais corado na
pele, abraça o velho Joaquim como se agradecesse pelo retorno a vida.

    O coronel muito agradecido, passou a tratar os negros com mais
respeito, atenção e dedicação. O velho negro Joaquim passou a viajar
por entre senzalas e fazendas, com uma charrete e um cavalo que lhe
foram dados pelo coronel, para salvar a vida de negros e brancos
enfermos, independente de tempo e qual fosse o mal do corpo ou
espírito.

    Hoje Vô Joaquim é um dos Pretos Velhos mais queridos e respeitados
da Religião de Umbanda. Com seu ar doce e sereno, um avô que todos
desejariam de ter, ele com suas calças brancas arregaçadas, pés
descalços, sua simplicidade e humildade, encanta a todos os filhos de
Umbanda.

    Podemos rotineiramente ver ele trabalhando ao lado de pés de
ervas, como arruda ou alecrim. Está sempre com uma vela traçada nas
cores preta e branca nas mãos, abençoando aos filhos que por ele
procuram. Também acostumamos vermos ele trabalhando com velas na
cor verde, que simboliza a cor do Pai das Matas, o Orixá Oxossi, na
qual ele tem imensa devoção.

    Esse Vovô amado não dispensa o seu cachimbo, composto com fumo e
algumas vezes com folhas secas de arruda e alecrim, para suas
cachimbadas leves, no qual solta sua fumaça no ar e fica admirando
como se estudasse cada forma.

    Esse é o nosso Velhinho Amado, o senhor da experiência, o negro
das matas, o contemplador da luz da Lua, o afilhado de Oxossi, nosso
querido Vovô Joaquim.

Saravá Vovô Joaquim!

Adorei as Almas!

Carlos de Ogum



sexta-feira, 10 de abril de 2015 28 comentários

A Reencarnação Na Visão da Umbanda

               


    Muito se fala dentro dos dogmas espíritas sobre "reencarnação".

    Mas o que seria reencarnação?

    Como é visto essa colocação entre as pessoas que pregam essa
verdade?

    Como será que devemos nos permanecer junto a algumas polêmicas
vindas de pessoas descrentes e más informadas sobre esse assunto?

    Antes de tudo vamos falar da palavra "reencarnação" em si. Vamos
ver qual é o significado no dicionário Aurélio:

"reencarnação s. f. Ato ou efeito de reencarnar(-se).  reencarnar v.
Intr. e pron. Tornar a encarnar-se; reassumir (o espírito) a forma
material."

    Ou seja, viver, morrer, viver novamente, morrer novamente até
estarmos evoluídos para uma próxima caminhada sem precisarmos ter a
matéria ou estar nesse planeta como ser vivente.

    Mas em uma visão mais espiritualista vamos perguntar:
O que é a reencarnação e pra que ela nos serve?

    A Reencarnação é voltar a viver num novo corpo físico. É uma nova
oportunidade de aprendizado, como prova do amor de Deus para seus
filhos.

    A Reencarnação é o processo pelo qual o espírito, estruturando um
corpo físico, retorna, periodicamente, ao polissistema material. Esse
processo tem como objetivo, ao propiciar vivência de conhecimentos,
auxiliar o espírito reencarnante a evoluir.

    O reencarne obedece a um princípio de identidade de frequências,
ou seja, o espírito reencarna em um determinado continente, em um
determinado país, em uma determinada região desse país, em uma
determinada localidade dessa região, com determinadas características
culturais (idioma, usos, costumes, valores, tradições, história etc.),
bem como em uma determinada família, de acordo com a sintonia que a
frequência do seu pensamento consiga estabelecer em relação a cada um
desses elementos.

    O espírito encarnado, fundamentando-se em seu existente (a bagagem
de conhecimentos e experiências adquiridos ao longo de toda a sua
história, seja encarnado, seja desencarnado), passa a exercitar sua
capacidade, a constatar e desenvolver suas potencialidades, enfim,
passa a construir seu momento presente e seu momento futuro. Vai
enfrentando contradições, dificuldades, obstáculos, facilidades,
administrando encontros e desencontros, permanecendo no seu plano
geral ou se desviando em função de algumas variáveis do processo, mas
sempre de acordo com sua vontade. No exercício do livre-arbítrio, o
espírito encarnado vai construindo seu equilíbrio ou seu
desequilíbrio, de acordo com a maneira pela qual enfrenta as situações
e a vida. Vai, por assim dizer, determinando-se, segundo a natureza de
seus pensamentos e atos. Por menos que faça, ou por mais que se
desequilibre, o espírito sempre alcança progressos em um ou outro
aspecto do seu ser . A evolução não está necessariamente vinculada ao
tempo de vida material, mas à intensidade com que ela é vivida. A
quantidade de experiências e o aproveitamento que é feito delas é
fundamental para o crescimento do espírito, não importando se as
experiências estão sendo vivenciadas no polissistema material ou
espiritual. É de se ressaltar que, entre uma encarnação e outra, o
espírito continua trabalhando, continua aprendendo, continua
evoluindo, de modo que ele não reencarna no mesmo estágio em que
desencarnou.

    Somente através da reencarnação se prova a justiça e a bondade de
Deus, pois é a única explicação racional para as desigualdades sociais
existentes no mundo.

    Como explicar o fato de crianças que morrem em tenra idade,
enquanto outras criaturas vivem quase 100 anos? Como explicar os que
nascem com saúde perfeita, enquanto outros nascem com deficiências
físicas grosseiras? Somente a reencarnação nos dá a chave desse
"mistério". Com as múltiplas experiências na carne, temos a chance de
adquirir e aprimorar conhecimentos que ainda nos faltam nos campos do
intelecto e da moral. Além de reatar as amizades com nossos inimigos e
reparar erros do passado. Quando estivermos evoluídos moral e
intelectualmente, não mais necessitaremos reencarnar.

    Muitas pessoas se perguntam, quantas reencarnações já tivemos, ou
quantas teremos ainda. Mas não podemos precisar esses números, pois
isso depende do estado evolutivo em que se encontra o Espírito.

    Algumas pessoas evoluem mais rápido por seu maior esforço,
portanto necessitam de passar menor número de vezes na carne, outros
são mais lentos permanecendo mais tempo no mundo de sofrimentos. Tudo
dependerá de nós. Quanto mais rápido progredirmos moral e
intelectualmente, menos encarnações teremos que sofrer.

    Quando nosso Espírito tiver alcançado todos os graus de evolução
moral e intelectual, seremos Espíritos puros.

    E após todo esse tempo de encarnação, desencarnação e
reencarnação, seremos encarregados de cumprir os desígnios de Deus,
colaborando com a manutenção da ordem universal e transformando-nos em
Seus mensageiros. O trabalho nunca acabará, pois a criação divina é
incessante e há diversos mundos em faixa de evolução diferentes. Os
Espíritos fazem parte do conjunto de inteligências que governam o
Universo, mas, em termos de existência, estão ligados a Deus, assim
como folhas em uma árvore ou gotas no oceano.

    Muitas pessoas se questionam o porque não temos lembranças vivas e
claras de nossas vidas passadas, mas isso é simples de demonstrar e
explicar. Estamos encarnados para evoluirmos, precisamos vencer os
erros de outras vidas, portanto o esquecimento temporário das vidas
passadas é uma necessidade. Não devemos nos lembrar das vidas passadas
enquanto estamos encarnados, e nisso está a sabedoria de Deus. Se
lembrássemos do mal que fizemos ou dos sofrimentos que passamos, dos
inimigos que nos prejudicaram ou daqueles a quem prejudicamos, não
teríamos condições de viver entre eles atualmente. Pois, muitas vezes,
os inimigos do passado hoje são nossos filhos, irmãos, pais e amigos,
que, presentemente, se encontram junto de nós para a reconciliação.
Por isso a reencarnação é uma bênção de Deus para seus filhos. As
lembranças de erros passados certamente trariam desequilíbrios de toda
ordem, uma vez que estamos muito mais perto do ponto de partida do que
do ponto de chegada, em termos de caminhada evolutiva. Depois de
desencarnado, normalmente nos lembramos de parte desse passado,
conforme o grau evolutivo em que nos situamos.

Resumidamente, reencarnação não serve para explicar
tragédias e desgraças; não serve para esconder a ignorância, não serve
como desculpa ao imobilismo; não serve como consolo para aquelas
situações que deveriam ser modificadas e não o são; não serve para
destacar o passado e paralisar o presente. Reencarnação é oportunidade
de aprendizado, é oportunidade de se aplicar o que se sabe e superar
as limitações através de vivências sucessivas no polissistema
material. Reencarnação é afirmação da unidade e da continuidade da
vida.

    Dentro de uma visão mais abrangente, podemos dizer que temos que
viver essa reencarnação para que possamos nos educar e consertar
erros do passado, aprendermos a conviver com algum fato ou pessoa que
possivelmente nos fez algum mal ou vice versa, aprendermos as lições
que nos foi dada para elevarmos a nossa evolução espiritual.

    Portanto estamos nessa vida de passagem apenas para evoluirmos,
apenas para aprendermos, apenas para perdoar e sermos perdoados,
apenas para nos prepararmos para a próxima lição.

    Vamos viver de acordo que possamos desencarnar e reencarnar de uma
maneira que possamos aumentar nossa luz evolutiva, e para isso temos
que usar, e usar bem o nosso livre arbítrio para chegarmos a pureza
desejada por Deus, nosso Pai Maior.



Carlos de Ogum

Colaboração de: Catarina de Xangô

 
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